Mulheres na produção de eventos: entrevista com Nathy Mendes

28/07/2021

A produção de eventos é o grande segredo, por trás das festas/festivais que tanto gostamos de ir. Quem vê um evento rolando, perfeitamente, com um line-up repleto de nomes de peso, nem imagina o trabalho todo que aconteceu, para que isso fosse possível. 

O Portal do B2B conversou com Nathy, que é produtora de eventos, aqui em BH. Ela dividiu com a gente um pouco sobre como é o setor, e como têm sido suas experiências, ao longo dos anos. 

Em um papo super divertido e cheio de aprendizados, confira a seguir o que a Nathy contou pra gente! 

Entrevista | Nathy: Produção de Eventos

PORTAL B2B:  Como você começou a ter contato com o universo da música eletrônica?

NATHY: Sempre gostei muito de organizar minhas próprias festas, passeios, excursões com os amigos, comissão de formatura… a que tomava a frente para fazer as coisas acontecerem! Mas, meu primeiro contato mesmo com o mundo dos eventos de música eletrônica foi quando tinha 12 anos.

Lembro que na época escutei falar do Anderson Noise, e fui em uma festa que ele tocou, na Serraria Souza Pinto – nem eu sei como consegui entrar! (risos) – e fiquei maravilhada. O ambiente, as pessoas, tudo. Foi ali que me apaixonei pela música eletrônica.

Em casa também tive uma influência muito boa, em relação a cena eletrônica – Depeche Mode, Kraftwerk etc. A partir dos 15 anos, comecei a ir no eventos de psytrance com mais frequência. E era tudo mais difícil, não tinha Waze, WhatsApp, internet no celular. Íamos procurando as festas pelo som mesmo, parando o carro vez ou outra pra tentar localizar o lugar do evento. Muitas vezes a gente não achava, e tínhamos que voltar para casa.

PORTAL B2B: E quando foi que você se interessou pela área da produção de eventos?

NATHY: Ao longo dos anos, por estar sempre presente na organização das coisas que fazia com meus amigos, formatura, festas, começar a trabalhar com a produção de eventos, profissionalmente, foi um processo muito natural.

Com 14 anos trabalhei com uma banda de reggae aqui de BH, chamada Manitú. Em 2001, 2002. Primeiramente com uma banca, que vendia camisas, CDs. Depois, com o passar do tempo, fui ganhando mais responsabilidades e passei a trabalhar com outras coisas – como arrumar o camarim, credenciamento de imprensa, viagens. Essa experiência foi uma escola para mim, no setor de eventos, aprendi muito! 

PORTAL B2B: Conta pra gente um pouco sobre o primeiro evento que você participou da produção.
NATHY: Em 2006 foi quando entrei de cabeça, no eventos de música eletrônica, através da Flowers, a convite do Romeu. Esse foi o primeiro evento que me encarreguei de produzir mesmo.
Sendo a primeira edição da festa, ninguém esperava que desse tão certo. A gente esperava 2 mil, 3 mil pessoas – o que, na época, era coisa pra caramba pra uma rave – e acabou dando mais de 5 mil. Foi um sucesso! Tanto que rolou mais de uma edição nesse ano, de 2006.
O Romeu me encarregou de lidar com o booking dos DJs, por falar inglês. Então, a primeira área de fato na qual eu trabalhei foi a de produção artística. Pelo MSN, eu tinha que conversar com os DJs, lidar com a logística de voo, transporte, buscar no aeroporto, organizar tudo. Brinco que é uma área que eu sei trabalhar com as mãos nas costas, pela experiência que já tenho.
E na época era tudo muito “não profissional”, então a gente bateu muita cabeça pra aprender a lidar com tudo. Até falo que aprendi mais em 5 anos de início de rave, do que muito produtor que já tem anos de casa, e já pegou uma cena mais estruturada para trabalhar.

PORTAL B2B: E, numa cena majoritariamente masculina, você já enfrentou algum desafio por ser mulher?

NATHY: Realmente, a maioria esmagadora no setor de produção de eventos de entretenimento é masculina. Mas, hoje em dia, fico muito feliz por ver cada vez mais mulheres, trabalhando com isso. Ter mulheres na produção ajuda muito na questão da organização, da comunicação entre a equipe.

Mas sim, até hoje ainda existe preconceito com as mulheres da área. Na época em que comecei  era muito pior, já ouvi cada coisa que nem vale a pena mencionar. Gente que duvidava da minha capacidade, do meu profissionalismo. Mas eu escutava e aquilo ali, no final das contas, me dava mais força pra ir melhorando cada vez mais. Deixava falarem o que quisessem, por que eu sei o que faço da minha vida, sei quem sou.

Com o passar do tempo, fui ganhando o respeito das pessoas, virando referência. Tudo fruto de muito trabalho. Hoje em dia já conseguem me ver como uma profissional, sem associar ao gênero. E hoje também temos uma rede de apoio, entre as mulheres, que ajuda demais. Temos um grupo no WhatsApp com mais de 250 produtoras, e tem também o Instagram da Fernanda Batista (@mulheresnaprodução) que é muito bacana. Esse grupo é impressionante, em qualquer hora do dia, que você mandar mensagem, terá alguém pra te ajudar de alguma forma – com serviço, contatos, etc. 

PORTAL B2B: Qual a saída encontrada para enfrentar a pandemia, levando em consideração que a área de eventos é sempre muito dinâmica e conta com várias pessoas envolvidas?

NATHY: Hoje em dia, eu infelizmente ainda não consigo viver 100% de produção de eventos. Queria, óbvio, é o que quero fazer da minha vida, mas ainda não é possível. Também sou analista de sistema, há 12 anos, então esse emprego fez muita diferença nessa pandemia. Mas a falta de eventos foi um corte no orçamento, sem dúvidas.

Logo que a pandemia começou, eu e o Romeu tivemos algumas ideias. A primeira “live festival”, uma live com vários artistas, fomos nós que fizemos, bem no início da pandemia, lá em Abril (2020). Evokings, Almanac, JORD, DJs gringos tocaram, mas tudo sem muita estrutura, cada um transmitindo da sua casa, sem algum tipo de remuneração. Logo a gente viu que esse formato de live não iria funcionar muito, para produtores de evento, pois é difícil de monetizar, e corremos atrás de outras opções.

Então o Romeu veio com a ideia de algum bar, pois é algo que estava podendo funcionar dentro das limitações e protocolos necessários.

Escolhemos um lugar que é realmente a nossa casa, o Marina Ventura, onde rolou a primeira Flowers, já temos uma história ali. E agora também é o lugar do Sunset Bar. Foi o primeiro bar nesse modelo, no Brasil, viramos referência. Vários produtores aqui de BH, de fora de MG (Brasilia, SP, Rio) foram nas primeiras edições para entender o funcionamento, para conversar com a gente sobre como estávamos operacionalizando aquilo ali.

Foi a saída para conseguirmos movimentar alguma coisa, durante esse tempo de pandemia.

PORTAL B2B: Sobre os próximos meses, você acredita que os amantes da música eletrônica, em BH, podem – finalmente! – voltar a nutrir expectativas para os eventos que virão? Como será essa adaptação aos novos moldes?

NATHY: Ontem mesmo (21/07), foi lançado um espaço no Mineirão –  Dimensão Hall – que está todo preparado pra receber eventos, conforme os protocolos. Ele conta com baias de vidro, tudo nos conformes. Então, aos poucos, vamos tendo mais opções. Começo a,  finalmente, ver uma luz no fim do túnel para a volta dos eventos.

Mas sempre usando máscaras, com número limitado de pessoas, seguindo as regras. É um trabalho em conjunto – do público e dos produtores. Da mesma forma que seguimos regras quando saímos na rua, vamos na padaria, temos que segui-las nos eventos também. É uma forma de podermos nos divertir, de forma segura, e colaborando com os produtores de eventos. Só assim para que o público possa, pelo menos, ter opções de lugares para ir.

Mas estamos sim, vendo essa luzinha no fim do túnel. Espero que até Dezembro, com o avanço da vacinação, a gente consiga flexibilizar pelo menos mais um pouquinho, esses novos moldes.

PORTAL B2B: Qual o maior perrengue que você já passou?

NATHY: Olha, a gente passa muito perrengue com legalização de evento. Isso é o geral, pra qualquer produtor. Pra ter o alvará do corpo de bombeiros eles precisam fazer a vistoria antes, e a vistoria tem que ser feita com a estrutura do evento já toda montada, então é uma correria. Temos vários parceiros, de engenharia, despachantes, advogados, para ajudar no processo, o que facilita muito, mas é sempre um perrengue.

Já tive perrengue também com pedidos inusitados de DJs, um caso engraçado. Nessa situação foi o pedido de um pato assado com laranja, na madrugada de Domingo, numa época que nem Ifood existia (risos!).

E já tive um super perrengue, em um evento que rolou no Mineirão. Estávamos com um evento muito grande, marcado lá, e com dois dias de antecedência nos avisaram que teria um jogo de futebol na mesma data. Tivemos que mudar a operação inteira do evento, de entrada, saída de fornecedor, montagem, desmontagem, credenciamento, estacionamento, público, tudo. Foi muito turbulento. Tinha saída de DJ coincidindo com a saída do público do futebol, várias mudanças na logística, um público de 15 mil pessoas, quase 2 mil fornecedores. Foi o maior perrengue que já passei, sem sombra de dúvidas.

PORTAL B2B: E o maior aprendizado, ao longo dos anos?

NATHY: O maior aprendizado é ser resiliente. É uma característica que todo produtor de eventos deve ter. Ele tá lá pra resolver problemas. Evento é eventualidade, vão surgir problemas, por mais planejado que tudo seja. Essa questão da resiliência te ajuda a trabalhar mais tranquilo, a ter mais calma pra resolver tudo. E é algo que levamos para absolutamente tudo na vida.

PORTAL B2B: Existe alguma festa/festival que você sonha em trazer para BH?

NATHY: Olhando bem para a programação de eventos de BH, mais focado em musica eletrônica, temos um calendário muito bom. Para todos os gostos, estamos bem servidos.

Mas, a vontade que tenho é trazer algum festival de Techno. Afterlife, Dekmantel, algo nesse sentido, para realmente ter a volta do Techno em BH. Até por que temos um expoente do Techno, referência da música eletrônica nacional aqui em BH, que é o Anderson Noise.

O Techno é um som mais industrial, que a galera as vezes demora um pouco pra compreender, mas é um som muito maravilhoso depois que a gente apura os ouvidos e consegue, de fato, degustar. Então tenho o sonho sim, de fazer algo grande, de Techno, aqui em BH.

Já fizemos algumas coisas, como trazer o Boris Brechja pra Flowers e a festa com a Charlotte de Witte. Mas, um evento grande, 100% voltado pro Techno, seria o meu sonho. E, em relação a algum artista, é trazer o Rufus du Sol.

PORTAL B2B: Por fim, alguma dica de ouro pra quem também faz parte da área?

NATHY: Tenho algumas dicas. A primeira é: humildade, sempre. Pro resto da vida, estamos em constante aprendizado. Mas, especialmente nesse início, na área dos eventos, ela é primordial.

E não espere as coisas virem de bandeja. Muita gente espera a iniciativa do outro, e não vai atrás. Então, se você realmente quer entrar na área, tenha disponibilidade, humildade, e vontade de aprender. Produção de eventos se aprende na prática, pegando pra fazer. Se você quer, de fato, entrar nessa e viver disso, tente aprender ao máximo, sobre tudo. Quanto mais conhecimento, em áreas diferentes, melhor.

Esteja disposto, esteja presente, corra atrás!

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